Periferia no centro

 Periferia no centro

Toda marca quer estar no centro. No centro do mercado, das atenções, da consideração. Em mais de 30 anos no mercado de comunicação sigo construindo marcas fortes e garantindo a elas um espaço nesse lugar tão desejado. 

Acontece que o centro mudou. E não só do Anhangabaú para a Paulista e depois para a Faria Lima. Mudou o lugar onde o trabalho acontece, as ideias florescem, a oportunidade brota. São Paulo, que expulsou a população para a periferia mas continua exigindo que ela visite o centro pra trabalhar diariamente, cumprindo jornadas absurdas de tempo e distância, ao mesmo tempo afastou muito do talento criativo e empreendedor das suas pessoas, criando obstáculos pra que pudessem exercer todo o seu potencial. 

Políticas públicas equivocadas só fizeram reforçar esse exílio ao longo dos anos e a pandemia acrescentou mais drama ainda a essa história, forçando as beiradas e quebradas a inventar soluções próprias pra encarar o inferno. 

Aprendi mais sobre a vida, as pessoas, e as pessoas que deixam marcas nos últimos três anos do que nos trinta anteriores. Observando, absorvendo, entendendo, mas especialmente agindo. Em Paraisópolis, principalmente, mas também em outras regiões igualmente invisíveis ou desfavorecidas. Conhecendo gente trabalhadora, criativa, incansável na hora de driblar as dificuldades. Capaz de desenhar projetos que viram exemplo no mundo todo, de exportar esses projetos pelo país, de transformar vidas todos os dias. E agradeço todos os dias a oportunidade de descobrir, na real, o que precisa realmente estar no centro do meu esforço e da minha atenção: gente, gente boa, gente com talento extremo e vontade maior ainda. 

O tipo de apoio que se presta durante uma crise é o que define relacionamentos pra sempre. Meus três anos na periferia me ensinaram que é possível mostrar o lado luz (esse que gera parcerias permanentes), mais do que os perrengues (que só geram apoios pontuais). Porque o verdadeiro distanciamento social é aquele que separa as pessoas por classe, renda, cor. Porque é possível achatar curvas sem massacrar as pessoas. Porque modelos econômicos solidários tem o poder de produzir oportunidade a partir da visibilidade. Porque o próximo normal vai precisar ser novo de verdade.

O novo jogo a ser jogado, inclusive pelas marcas, precisa colocar as pessoas e o talento no centro, ampliar suas possibilidades, valorizar suas iniciativas, se inspirar com suas criações e dar escala a elas. Empatia é o nome desse jogo, generosidade e parceria são a estratégia, urgência e foco são os meios. 

Colocar a periferia no centro é entender que os mesmos que uma vez construíram essa cidade com tijolos e cimento, tem qualidade e potencial pra reconstruir, dessa vez com ideias.

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Marcello Barcelos
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É fundador da Barça Estratégia Criativa e Comunicação e um dos parceiros idealizadores da agência Cria Brasil.

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